quinta-feira, 30 de junho de 2022

O homem mais rico do mundo

(Imagem: daqui)

Depois de mais uma semana difícil, onde a ciência de atitudes tomadas na contra mão da maioria me relegou um singelo espaço de desprezo no trabalho, juntei os novos insultos e desprezo aos antigos proferidos por bocas, mãos e ombros outrora tão amigos. Eles pensaram que me magoariam, mas não faziam ideia de meus abandonos e fugas passadas e em como um escudo forte e preciso é criado a cada situação em que a liberdade nos puxa para a vida ao seguirmos um caminho contrário às convenções criadas para esmagarmos ao outro alegando vender paz, liberdade e amor. 

Abri a porta de casa com todo aquele novo velho apetrecho de palavras horríveis saídas de alguns lábios amáveis embebidos no amor da modernidade. Um beijo. Outra porta. A descarga. Liberdade mais uma vez. O exercício de levar desaforo pra casa é libertador. Você não precisa sair espalhando que faz isso por ai. Apenas se liberta e fica grato por todo o presente que vem depois. Onde todas aquelas visões de mundo repousam em seu devido lugar, ao doce e suave som de uma descarga acionada. 

Quando caminho pelas ruas e vejo o céu azul ou a chuva batendo em minha pele, enxergo a cegueira de lutar pelo que já é nosso desde as eras eternas, como um presente, mas não percebemos por nos dividirmos a cada dia em mais e mais fatias. Como um queijo cheio de buracos é fatiado para facilitar ser devorado por bocas e dentes que não se importam. Escolher ser uma pedra no meio da comida pode não ser agradável, mas é libertador. 

É nesse momento que percebo que emprestaria dinheiro ao homem mais rico do mundo e ainda me sobraria para comprar tudo o que ele tem. Muitos desarvoram a existência tentando conquistar a dádiva que já nos foi dada antes de nascermos, mas tentamos tomar posse dela ao invés de apenas abraça-la e deixar que ela abrace todo o resto. Os que também fazem parte de quem nós somos, mas que perdemos de vistas por conta das fatias que nos tornamos. 

Também me sinto tentado a reter esse presente só para mim, não posso negar. Mas entendo o que teria que fazer para que tantas mãos livres alcançassem o que é de todos se dividirmos entre uns poucos. Deixar ir depois de um abraço também é uma maneira verdadeira de pertencer e ser pertencido. O céu e a terra são meus se eu aceitar que me foram dados como foram dados a outros. Eu emprestaria essa minha riqueza ao homem mais rico do mundo. 

Às vezes, quando acordo, sou tentado a provar que também sei buscar o que se busca hoje em dia. A soberba, o amor raivoso, a mão única de soluções imperfeitas, o revide. Mas cantos de fora da janela me lembram que há uma dádiva maior a ser enxergada e mantida e um milhão de coisas a serem evitadas. Não há dinheiro que pague uma boa descarga, é o que os cantos lá fora me dizem. 

A canção dos pássaros fala: "todas as coisas me são licitas, mas nem todas me convém. Todas as coisas me são licitas, mas não me deixarei dominar por nenhuma delas."
É depois disso que a liberdade vem tomar café comigo assim que desço da cama.